Reforma eleitoral em debate: especialistas alertam para riscos de soluções parciais e defendem mudanças estruturais

A Comissão Técnica (COTE) do diálogo nacional inclusivo realizou, no dia 15 de Dezembro de 2025, no Centro Internacional de Conferências Joaquim Chissano (CICJC), em Maputo, uma mesa-redonda sobre a reforma do sistema eleitoral, num cenário marcado por contestação dos processos eleitorais e impasses institucionais no país. O debate foi moderado por Guilherme Mbilana e contou com as intervenções de Miguel de Brito e Eduardo Chiziane, especialistas em matéria eleitoral.

Miguel de Brito afirmou que o processo eleitoral deve garantir a escolha de líderes, a legitimidade do poder político e a estabilidade do sistema. Para que seja democrático, defendeu, deve assentar-se em cinco princípios: universalidade, igualdade, liberdade, transparência e justiça. Qualquer reforma, advertiu, deve reforçar esses fundamentos. “Qualquer proposta de alteração deve ser um passo em frente para a consolidação destes princípios. Não se justifica a introdução de mudanças que resultem num retrocesso ou que falhem em aperfeiçoar o que já está estabelecido”, frizou.

Eduardo Chiziane apontou como fragilidades centrais do sistema a dispersão da legislação eleitoral e a lentidão do contencioso. Defendeu a criação de um Código Eleitoral Único como forma de garantir coerência e previsibilidade jurídica, mas sublinhou que a medida exigiria consenso político para superar a “desconfiança histórica sobre a matéria eleitoral”. Segundo Chiziane, “uma vez estabilizada como código, significa que ela não vai ser revista na eleição seguinte”, o que torna essencial a construção de confiança entre os actores políticos.

Como alternativas, referiu uma revisão pontual da legislação, considerada limitada, e o reforço do poder regulamentar da Comissão Nacional de Eleições (CNE). Esta última opção, alertou, pode gerar desconfiança, uma vez que se trata de um órgão de composição partidária e é percebida como uma tentativa do partido maioritário de definir as regras do processo eleitoral.

No debate, vários participantes defenderam reformas estruturais, incluindo a despartidarização da CNE e do Secretariado Técnico de Administração Eleitoral (STAE), o reforço dos Tribunais Distritais e a revisão do sistema político. Foram ainda discutidas propostas como a introdução de credenciais universais para fiscais, a composição aleatória dos cadernos eleitorais, a realização de todas as eleições num único dia e a responsabilização política dos eleitos. Sobre o voto electrónico e a digitalização das contagens, surgiram reservas, associadas a limitações técnicas e à fraca literacia cívica.

Durante a mesa-redonda, o Presidente da COTE afirmou que o Diálogo Nacional Inclusivo assenta na diversidade de posições e na liberdade de expressão. “Todos tiveram oportunidade de expressar suas opiniões, de forma livre, aberta, sem receios e sem censura. É isto mesmo o diálogo nacional”, afirmou. Acrescentou que “aqui não há algemas às palavras”, defendendo que o pluralismo de ideias é essencial para a construção de consensos.